sexta-feira, 6 de julho de 2012

Uma pausa

A partir de hoje, este blog ficará inativo. As postagens de Hermínio Bello de Carvalho serão publicadas em uma nova página: OFICINA DE COISAS & REPAROS

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Ademilde Fonseca, Pixinguinha e o feitor Pimentel


A Rainha do Choro

No mítico Bar Gouveia da Travessa do Ouvidor, Pimentel exercia com autoridade a função de feitor, aquela figura amedrontadora que aparece nas páginas sujas de nossa história, um vigilante das senzalas onde se amontoavam os escravos. Contam os livros que certas pessoas ousavam enfrentar aquela figura do Demo e ao seu chicote, e eram açoitados sem dó nem piedade, acorrentados no tronco.

Claro que ali no bar o cenário nem de longe lembrava aqueles depósitos degradantes e nem os porões dos navios negreiros que traziam escravos da África. A bem da verdade, havia sim ali um negro, de narinas dilatadas e permanente copo de uísque ao alcance das mãos.

O feitor a que me refiro tinha nome, CPF e profissão definida: advogado, moreno e jovem, e creio que na época atuava na Petrobrás. Fizera do Bar Gouveia o ponto de encontro com seu maior ídolo, São Pixinguinha. O chicote a que me referi era meramente simbólico, metafórico, utilizado apenas para açoitar a mim e ao Santo, cobrando-nos músicas, mais músicas – “vocês andam trabalhando muito pouco”. Daí termos designado de feitor um belo amigo chamado Albertino Pimentel Filho, hoje com 75 anos, dois a menos dos que meus recém completados 77. Pixinguinha teria hoje 114 anos; morreu em 73.  Relevem nossas lembranças, que podem surgir esmaecidas.

Reencontrei Pimentel na Senador Dantas há uns dois ou três anos. A mesmíssima elegância de quando o encontrava no Gouveia. Fidelíssimo, era quase sempre encontrável à mesa de Pixinga, nos horários de almoço a que tínhamos direito na época. Ambos funcionários de carteira assinada, ambos na casa dos 30 anos, ambos admiradores reverentes à figura papal, cardinalícia, aquele Baobá frondoso que a nós recebia com paciência e carinho. Mas, de quando em vez, Pimentel nos vergastava com seu chicote: queria que fizéssemos mais músicas, precisamos produzir e gravar mais, como se já não tivéssemos descido a rampa do Maracanazinho naquele Festival da Canção de 1967, os dois concorrentes parecendo pingüins nos smokings alugados no Rolas. A música era o choro “Fala baixinho”, entregue à interpretação da Rainha Ademilde Fonseca.

“E Ademilde, hein Pimentel?” 
A rainha nos fez a falseta de falecer dia 27 de março, véspera do meu aniversário. Eu acabara de sair de uma segunda cirurgia de câncer na mama, meu companheiro Luis Sérgio colocara um sétimo stent – “o que a vida não apronta pra gente, hein Pimentel?” – comentei, há pouco, ao telefone com o querido amigo. Lembrou-se do nosso encontro, quando o cineasta Miguel de Faria Jr. queria fazer um filme sobre o Pixinguinha, e achei indispensável que gravássemos um depoimento do feitor. Lá fomos nós para um Bar Gouveia totalmente fake na Galeria Cruzeiro, que lembra o original em alguns detalhes. O chapéu de Pixinga, o copo onde bebia seu uísque de cada dia, algumas fotos na parede. O filme nem sei que fim levou, mas serviu para me reaproximar do amigo.

Tal e qual como me reaproximo agora. Já combinamos um novo encontro para lembrar aquelas belas e infindáveis tardes no Gouveia. O bar eu já conhecia de sobra: o pequeno lugar fora, antes, uma joalheria pertencente a Arsene Arsenian, patrão de meu falecido  mano Eraldo, que lá trabalhava no balcão como vencedor. Quando nosso pai Ignácio trazia nossas marmitas lá da Penha, almoçávamos escondidos atrás do balcão – eu sem imaginar que, no futuro, ali beberia com São Pixinguinha.

Contei e já recontei essa história mil vezes, mas é de Ademilde que eu gostaria de falar agora. Porque fomos um pouco “bois de piranha” no já citado Festival, os primeiros a serem apresentados ao distinto e ruidoso público. Um som horroroso! O arranjo de Lindolpho Gaya era lindo, mas a tecnologia era jurássica. O áudio atravessou e de repente, atônitos, vimos/ouvimos nosso choro diluir-se num mar de sonoridades confusas. Se vaiaram? Não me lembro – juro.

Ademilde Fonseca foi a Rainha do Chorinho, título que ganhou junto com um trono que jamais desocupou, e que ninguém nunca ousou nele sentar.


Aos 91 anos deveria ter recebido muitas homenagens, inclusive uma que estava programada para acontecer na Escola Portátil de Música, onde era idolatrada. A modernidade de Ademilde está comprovada nas faixas que convido a partilharem comigo, à beira de um oloroso vinho tinto. “Derrubando violões” é um choro pirotécnico, que exige altíssima musicalidade do intérprete, e é de autoria (inclusive os versos) do Maestro Carioca, pai do também maestro Ivan Paulo.

Mas é também uma delícia ouvir nossa Rainha Ademilde entrar nessa montanha russa musical, cheia de curvas, plena de modulações. É algo que tenho um imenso prazer e honra de repartir com vocês e com amigo Albertino Pimentel Filho.

Em tempo: doei toda a minha Coleção Pixinguinha (retratos a óleo, caricaturas diversas) à Fundação do Câncer, presidida pelo meu mastologista Dr. Marcos Moraes. Quem quiser saber mais sobre essa instituição, que atende a doentes terminais, procure ler o “20 Anos de uma Boa Notícia”, livro publicado pela Editora Casa da Palavra. É um belo Trabalho.

Um projeto que não virou projeto
Ontem me telefonaram, quase simultaneamente, o grande pesquisador Jairo Severiano e o sete cordas Tiago Prata. Há pouco foi Pedro Paulo Malta, jovem pesquisador que integra o elenco do “Sassaricando”, musical de Sergio Cabral e Rosa Maria Araujo.

Comentei com os três o quanto me angustiava entrar em meu computador e constatar quantos projetos culturais ainda não consegui realizar. Por coincidência, esbarrei num trabalho que realizei para a Oficina de Coisas que ministrei na Escola Portátil de Música. A Escola, aliás, neste março de 2012, bateu seu recorde de inscrições: 1059 alunos vão aprender e discutir Pixinguinha, Anacleto de Medeiros, Villa-Lobos, Tom Jobim, Guinga, Radamés Gnattali, Chiquinha Gonzaga – e estarão sob a chibata amorosa e competente de mestres iguais a Luciana Rabello, Mauricio Carrilho, Pedro e Paulo Aragão, Cristovão Bastos e outras feras que construíram um dos mais belos programas educacionais deste país. A Escola Portátil já deu frutos: há uma série no CCBB (Centro Cultural do Banco do Brasil) apresentando apenas composições inéditas feitas naquela Escola. Ou seja, uma nova geração de chorões, atestando a modernidade e contemporaneidade do gênero.

Sim, e aí encontrei o esboço de um projeto que espero seja aproveitado (quem sabe?) pela nova direção da Funarte. Não custa nada, não é meu Pimentel? Não é, Jairo? Ensinar os caminhos trilhados pelo nosso companheiro de Bar, patrono do gênero, o nosso querido Alfredo da Rocha Vianna Junior, o São Pixinguinha.

E vamos lá: Coisa monográfica Nº 2 –  Choro letrado e  Samba-Choro
Edital / Regulamento
O choro seria um gênero eminentemente instrumental, que não caberia ser letrado. Essa é uma tese defendida por diversos especialistas no assunto. Mas os estudos que foram processados nas últimas décadas sobre o gênero, provocando seu inventário, revelaram uma farta produção de choros que receberam letras – como o “Carinhoso” – tornando impossível, portando, ignorar-se a sua existência.  E o samba-choro é uma das inúmeras variantes do gênero que surgiu a partir da popularização dessa manifestação musical.

A proposta
Arrolar esses subgêneros, inventariando-os, é uma forma de se estudar as múltiplas formas que foram surgindo a partir de Joaquim Antonio Callado. Uma maneira também de se conhecer gêneros paralelos que ajudaram sua constituição. Pode-se abordar, inclusive, sua inserção no universo da música erudita e semi-erudita – tomando-se como exemplo a obra do compositor Villa-Lobos que, em 1920, fez nascer a célula mater da monumental série de 14 choros. Villa já abordara o gênero entre 1908 e 1914, ao compor a “Suíte Popular Brasileira” (Mazurka-choro, schotisch-choro, valsa-choro, gavota-choro, chorinho). O gênero apareceria ainda na ária da “Bachianas 6” (1938) – e ao longo de sua obra.

Subsídios
Mestre Ary Vasconcellos é incisivo no capítulo “Regras do jogo” (“Carinhoso etc, história e inventário do choro”, ed. particular de 1984). “Quanto ao choro cantado, concordo em gênero, número e grau com mestre Luiz Heitor (Correia de Azevedo): ‘Choro é música essencialmente instrumental, repele qualquer feição melódica vocalizável e, muito mais ainda, textos poéticos’ (150 anos de Música no Brasil, págs. 149-150).” E, ao apresentar a discografia do choro, Ary exclui previamente aqueles letrados: “choro vocal deixa de ser choro para ser canção. Outro Departamento”.

Já a professora Oneyda Alvarenga, discípula dileta de Mário de Andrade, aponta à pag. 299 do seu “Música Popular brasileira” (Ed. Globo, 1960): “Especificamente instrumental até nosso tempo, o gênero choro vem apresentando, de poucos anos para cá, peças vocais ligadas ao samba, caracterizadas por uma linha melódica saltitante, em que a voz é praticamente o sucedâneo do instrumento de sopro solista. Esses choros vocais conservam de preferência a forma do choro instrumental, que é geralmente em três partes assim distribuídas : A-B-A-C-A. Entretanto, adotam também o corte em estrofe e refrão do samba urbano, caso em que recebeu a designação definidora de samba-chôro”.

Os professores Anna Paes e Pedro Aragão repetem, na apostila editada para o III Festival Nacional de Choro (2007, pag. 24) os mesmos conceitos emitidos à pag. 21 da apostila de 2004. “O samba sempre esteve relacionado historicamente com o choro – a maioria dos músicos que acompanharam cantores de samba era formada pela escola do choro: Pixinguinha, Benedito Lacerda, Dino, Meira, Canhoto, entre muitos outros. A influência do choro pode ser sentida também nas composições de muitos sambistas, como Nelson Cavaquinho – cujo modo de tocar violão, repleto de baixarias, nos remete aos contrapontos do choro. (...) Dessa relação entre samba e choro nasceram dois outros gêneros que poderíamos chamar de samba-choro e choro-samba. (...) Note-se que existem choros que receberam posteriormente letra. Estes não constituem samba-choro, pois não foram compostos originalmente para receber letras, como é o caso de ‘Doce de côco’ e ‘Ingênuo’ (letrados por Hermínio Bello de Carvalho e Paulo Cesar Pinheiro, respectivamente). São simplesmente choros.”

Histórico
Se a professora Oneyda Alvarenga avançou até “a designação definidora de samba-choro”, podemos fazer ilações do pensamento de seu Mestre, ao consultarmos o verbete dedicado ao gênero em seu “Dicionário Musical”, quando alude à equivalência encontrada entre o agrupamento na execução do “Urubu” (“maravilhosamente executado por Pixinguinha, uma das excelências da discoteca brasileira”) ao “hot-jazz admirável de Louis Armstrong” (novamente comentários do próprio Mario) executando “Chinatown, My Chinatown” e “I Got Rhythm” – que “são, por assim dizer,  choros-hot”.


Quando Ademilde Fonseca cantou o “Tico-Tico no Fubá” pela primeira vez, em 1942, e acompanhada por Benedito Lacerda, Mário de Andrade já havia abandonado as mesas da Taberna da Gória e dos bares da Galeria Cruzeiro e do Vermelhinho, que frequentara no período (1938/1941) em que se auto-exilou no Rio de Janeiro. Abandonara as discussões sobre o samba rural paulista, para aprender os sambas cariocas de Ismael Silva. Quando, em novembro de 1954, mestre Lúcio Rangel desce o sarrafo em Ademilde Fonseca na “Revista da Música Popular” por ela ter gravado o “Pinicadinho”, a antiga polca-choro de Ratinho numa versão letrada por Jararaca, não estaria repisando conceitos soprados aos ouvidos de Mário, quando iam se encontrar na Taberna da Glória?

Mas o espírito democrático de Lúcio, editor da revista, fez publicar em setembro de 1956 um artigo de Mário Faccini, que abria aspas para citar o enfocado da matéria, o Henrique Foreis (Almirante, a maior patente do Rádio): “Quem primeiro buscou estabelecer uma concordância entre o fraseado melódico e o canto foi Gadé, que iniciou a série com ‘Amor em excesso’, aparecido em 1932”. Gadé, grande pianista, que forneceu ao radicalíssimo Almirante nada menos que oito choros letrados, os quais o grande radialista-cantor gravou num antológico disco de dez polegadas.

É sempre oportuno lembrar que já no início do século XX, acompanhando as primeiras gerações de chorões, o poeta Catulo da Paixão Cearense letrou inúmeros choros (e todos os seus gêneros conformadores como a polca, o schottisch, a valsa, etc) de compositores como Irineu de Almeida, Anacleto de Medeiros, entre muitos outros. Destaque-se por exemplo o schottisch “Rasga Coração”, de Anacleto (“Yara”, originalmente), que mais tarde seria utilizado por Heitor Villa-Lobos em seu “Choros 10”.

Quanto ao mestre-orientador da professora Oneyda, devemos estar sempre atentos à complexidade de sua obra, que vai nos oferecendo interfaces surpreendentes, que nos leva a tirar ilações as mais estapafúrdias a respeito de seus conhecimentos sobre a matéria. Ademilde Fonseca iria gravar mais tarde uma versão choro-hot do “Urubu malandro” devidamente letrado, cuja versão instrumental de Pixinguinha encatara a Mário. E não esquecendo a fenomenal dupla Gadé e Walfrido Silva, com seus sambas-choro transcendentais.

Finalizando
Para muitos, o “Chega de saudade” nada mais é senão um choro bossa nova. Quem duvidar, que ouça Jacob do Bandolim improvisando com o Zimbo Trio, naquele concerto que tive a honra de dirigir em 1968, colocando Elizeth ao lado de seu descobridor, do Época de Ouro e do Zimbo Trio.
Pois, é Pimentel. Você nos deu o mote para essa homenagem à Rainha Ademilde Fonseca.
Obrigado.

Herminio Bello de Carvalho   

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Janelas, portas e cartas abertas

HELICÓPTEROS E BEIJA-FLORES

Vejo a abordagem cinematográfica feita pela polícia ao triplex do patrono da Escola de Samba Beija-Flor. Um helicóptero sobrevoa o prédio de luxo, os policiais descem de rapel – e a câmera abre para a piscina onde um lindo beija-flor está pintado sob as águas azulíssismas. Vamos jogar nossos olhos para o obituário de Joãozinho Trinta, n’ “O Globo” de 18/dez/2011: “O carnavalesco que exaltou o luxo passou os últimos dias na pobreza (....), não tinha plano de saúde e ninguém sabia quem ia pagar a conta do Hospital”. Na pobreza? Foi assim que morreu o genial carnavalesco que elevou a Beija-Flor aos píncaros da glória? Façam uma leitura atenta do que expus e chorem suas lágrimas de sangue sobre as águas azuis da tal piscina onde, no fundo dela, adormece pintado um lindo beija-flor. Voltarei ao assunto, noutro tópico. 

CAMERATA BRASILIS

Não, não fui ao recital-lançamento do CD da Camerata Brasilis. Disco belíssimo. Convidado de honra: Nailor Proveta. Que músico fantástico esse Proveta! E participação especial de Aquiles Moraes e Everson Moraes. É desses dois últimos jovens músicos que vos falo agora. Eu os conheci como integrantes do conjunto “Os Matutos”, grupo nascido em Cordeiro e regado com a água de cheiro do conhecimento pelos professores da Escola Portátil de Música.

Há alguns dias o Everson (hoje com 25 anos) me telefonou pra saber se eu tinha alguma coisa do Norato, trombonista fabuloso que há décadas se aposentou como integrante da Orquestra Sinfônica Brasileira. Por “alguma coisa” se entenda foto, partitura, um escrito qualquer. 

Se conto a suncês essas coisas é porque elas tem relação com este saite e com o blog que precisaria ocupá-lo mais vezes com as coisas novidadeiras que se passam no mundo da música, esse mundinho onde existem provetas, noratos, eversons e aquiles. Bem, já vos conto. O susto do trombonista Everson foi grande quando minha tela de TV foi ocupado por aquele músico ebanáceo, num registro que fiz na TVE em 1977. Que grande músico, meu Deus! E que conversa boa, a dele! O deslumbramento se instalou nos olhinhos-faróis de meu querido Everson.

“Informação não se engaveta”, “Informação tem que circular” – esses bordões os fiz ecoarem pelas trompas de Eustáquio  do nosso jovem trombonista.  E lá se foi nosso Everson com uma cópia do vídeo debaixo do braço. E aí a história ganha desdobramentos. Fuça daqui e dali, e eis que o matutinho descobre que, ao contrário do que pensávamos, Norato está vivíssimo. Aos 91 anos, esquecido por essa geração que nunca o ouviu tocar, ei-lo agora fazendo uma espécie de master class na UFRJ, levado pelas mãos jovens e novidadeiras desse menino que nos dá orgulho danado em vê-lo praticando o fazer cultural, levando adiante aquilo que aprendeu. Seu irmão mais novo, Aquiles, é um trompetista que o João de Aquino diz ter “lábios de mel”, tal a beleza de seu sopro. Vamos encontrá-lo, agora, tocando na Sinfônica como um de seus mais jovens integrantes.

Nosso acervo tem essa divina serventia: mostrar os noratos que existem por aí, sob um manto de total invisibilidade, manto que os eversons da vida tratam de descobrir o que era apenas um busto sem placa identificatória na praça da desmemoriada memória musical brasileira.

Obediente ao ditador que ora escreve este relato, Everson gravou a master class. Ficou de me mandar uma cópia. Vou cobrar.

BODAS DE DIAMANTE

Há dias fui às Bodas de Diamante, 60 anos de união de minha única irmã, Gilda, com meu cunhadão Dino Battesini. Sangue italiano, o dele, diferente do nosso: bem caipira, bem Ilha da Jibóia, onde nasceu minha mãe, filha de um violeiro afamado de nome Gregório. Quando havia um desafio nas imediações, minha avó materna tomava uns góros, pegava a viola, fazia um farnel – e lá ia meu avô na canoinha remada por ela, enquanto ele ia “temperando” a viola para o desafio. Que só voltasse vencedor, o que invariavelmente acontecia. Meu pai terá nascido em Rio Bonito, alguns dizem. Outros, pelas bandas de Cabo Frio. Tinha ascendência nobre de judeus portugueses que fugiam das perseguições da época. Nunca perguntei ao velho, quando ele ainda sabia responder as coisas, quem seria o tal Barão de Monte Bello. A prof. Neusa Fernandes ficou de pesquisar isso em Portugual, mas até agora nada! Dino e Gilda me deram sobrinhos, sobrinhos netos. Alguns vieram com o dom da música, outros com apetite de vida e saberes. Puta orgulho tenho dessa garotada. Minha irmã está linda aos 86 anos: mãe, avó, bisavó. Ela e o marido ainda se beijam na boca. Meu sobrinho toca um violão maneiro, vai de Villa-Lobos a Leo Brouwer. Sua filha, Giulia, é cantora e compositora. Que sobrinha-neta talentosa, essa menina. Freqüentou a Oficina de Coisas da – claro! – Escola Portátil de Música, tendo o tio-avô como Oficineiro.

SALVADOR, ALAGADOS, BAHIA

Como o assunto ainda é o nosso saite, transcrevo (para depois comentar) a carta que, com autorização do remetente, divulgo neste espaço:

Querido Hermínio, bom dia. Como você está? Recebeu o jornal dos estudantes de comunicação que te enviei? Olha, escrevo para te agradecer a sua atenção e dizer que agora com essa matéria centenas de pessoas daqui da Bahia, dessa nova geração que é muito desinformada, começam a te conhecer e me empenho nisso porque tenho por você o mesmo respeito que tenho pela Clementina, Drummond, Cartola, Aracy, Mário de Andrade e tantas pessoas importantes para o Brasil e o mundo que aprendi a amar com você. Você é a chave que me fez descobrir dona Zilda, dona Coleta, Emilia Biancardi, Antonio Candido e tanta gente que hoje faz parte de minha vida de uma maneira real. Do mesmo modo você agora é real e presente para os jovens estudantes que são órfãos de conhecimento e de cultura. Peço desculpas pelas mal traçadas linhas da estudante que te escreveu, e, no entanto, estou certo de que a sua disponibilidade em conceder a entrevista que virou o “perfil” está abrindo as portas do entendimento de muita gente jovem da Bahia que vai visitar o teu acervo e trilhar novos caminhos na cultura. Estou à sua disposição. Não fique triste e, meu querido, me responda, pois estou preocupado, pois você é muito importante para mim e não quero e nem quis te trazer nenhum dissabor, somente quero que você e a sua obra sejam conhecidos neste estado onde a cultura está indo ladeira abaixo e isso me dói muito. A Aninha Franco te escreveu e quando vier à Bahia, irás no Teatro XVIII e na República, a casa que Aninha criou no Pelourinho para cuidar da cultura e lá está você e sua obra, o que me fez chorar muito por saber que você é tão bem cuidado por uma Bahia que eu nem sonhava existir. É isso. Meu velho, estou aqui, muitos precisam de você, te peço de me responder para acalentar meu coração que não quer ver meu velho triste, mas sempre reconhecido e amado, porque se hoje eu estou estudando e lutando pela cultura brasileira é porque conheci o senhor, meu querido mestre. Um abraço do Zé Eduardo.

Apresentemos o missivista a você, eventual ledor deste blog: mestre em psicologia e doutor em saúde pública pela Universidade Federal da Bahia, ele trabalha com projetos sociais na área de Novos Alagados – onde, aliás, nasceu. Autor dos livros “Travessias: a adolescência em Novos Alagados”; “Novos alagados, histórias do povo e do lugar” e do livro que estou lendo agora – “Cuidado como vão, repercussões do homicídio entre jovens da periferia”. Nome completo? José Eduardo Ferreira Santos, mulato que nem o autor destas linhas, e que agora está sendo lido na Itália – porque um livro dele, mais recente, acabou de ser editado por lá. Eu o conheci através dos Irmãos Caverna, Jussiê e Daniel, que foram meus “alunos”(aspeio, porque jamais fui um professor) na Oficina (de Coisas) que ministrei na Escola Portátil de Música.

Enfim, essa cartinha que vaidosamente transcrevi é para dividir com os construtores do nosso saite a repercussão que ele tem junto à gente da Bahia.

DONA ZILDA PAIM, SANTO AMARO DA PURIFICAÇÃO

Acho melhor não dar muitos volteios, e ficar ainda com nosso amigo Zé Eduardo que, aflito, me escreve:

Querido Hermínio, boa tarde. Estive em Santo Amaro e vi que a situação da querida Zilda Paim se complica: sua casa foi assaltada e seu acervo corre risco. Ela tem 92 anos. Entrei em contato com a artista Aninha Franco e vamos ao secretário de cultura. Neste sentido, gostaria de te pedir para atualizar e me enviar assinada a carta que você escreveu sobre ela em 2007. Te agradeço, pois estou me empenhando em cuidar da cultura e de dona Zilda que te manda um beijo – e depois te envio pequeno novo livro dela. Com gratidão, José Eduardo

Vou transcrever um artigo que escrevi há algum tempo (“Um protesto carioca”, sobre essa grande figura que é a Prof. Zilda Paim, há poucos dias citada pelo Caetano (Veloso) em sua coluna dominical n’O Globo:

Me perguntam quem é essa tal de Zilda Paim, a quem dedico o livro sobre Aracy de Almeida que estou lançando agora pela Editora Folha Seca.

Ela é uma estudiosa do folclore, uma professora de quase 90 anos de idade e que deu régua-e-compasso a muito pesquisador que ama as manifestações do recôncavo baiano.

Ela, a Prof. Hildegardes Vianna (já falecida) e a também Prof. Emilia Biancardi, foram peças fundamentais na minha vida. A primeira, todo mundo sabe que, além de pesquisadora emérita, tem um texto fantástico que, volta e meia, me faz pensar no Caymmi – que adora redescobrir o vocabulário bahiano, cujas atipicidades ela domina como uma espécie de Jorge Amado de saias. Emilia, todos sabem, é do “Viva a Bahia”, foi comigo à Europa e  depois seu grupo de bailarinos, cantores a percussionistas (com o saudoso “seu” Negão à frente)  nos acompanhou aos Estados Unidos, numa inesquecível – em  todos os sentidos – excursão que tinha, ainda, uma estreante bahiana, então  jogadora de basquete, hoje a famosa Simone.

Profa. Zilda Paim entrou nessa história numa ida a Santo Amaro, a convite de Bethânia. Ela desejava me apresentar ao Roberto Mendes, compositor santamarense. Queria, acho, nos fazer parceiros. Conseguiu.

Sim, eu já tinha ouvido falar de Dona Zilda, e pedi ao Roberto que me levasse até lá. Fiquei fascinado com o vasto material sobre Santo Amaro que ela coletava e guardava em arquivos toscos. Perguntei: e o que a Senhora vai fazer com tudo isso? “Tacar fogo!”, respondeu a desaforada, só pra me atazanar o espírito. Riu e me explicou que ninguém na cidade dava nenhum valor àquilo.

Selecionei uns artigos, encomendei lá em Santo Amaro mesmo que o digitassem – e recebo esse catatau no Rio e começo a mexer meus pauzinhos. Nessas horas consulto sempre o Roberto Sant’Anna, que eu conheço há décadas. Ele entendeu meu interesse e, para minha surpresa, logo depois recebo pelos Correios um volume com alguns exemplares do livro “Relicário popular” da insigne mestra, livro que ele, belo animador cultural, cavou uma edição na  Secretaria da Cultura e Turismo – isso em 1999.

Quando Dona Canô fez 95 anos, fui lá convocado por Rodrigo e Jota Veloso para me apresentar no belo teatro que erigiram na cidade. Coisa de primeiro mundo. E revi Dona Zilda Paim, agora toda feliz com um memorial que destinaram para ela, enfim, ter todo seu acervo preservado. Era, ainda, uma promessa.

Alegria de pobre dura pouco. Recebo a notícia que, por desarranjos burocráticos que nem consigo atinar quais sejam, tudo voltou à estaca zero. Infelizmente Caymmi não está no Rio, Bethânia está gravando seu DVD e Caetano – cidadão do mundo – anda pelos Estados Unidos, lançando seu disco. Nem tenho com quem reclamar.

Mas aí lembrei que o Gil é agora Ministro, e não sei como ele pode apitar aí nas bandas de Santo Amaro. De qualquer forma, acho que a Profa. Zilda Paim merece homenagens, e não aporrinhações desse tipo a essa altura da vida.

E, afinal, ela é uma espécie de guardiã da cultura de Santo Amaro da Purificação.

E é preciso salvar a terra que deu berço à Tia Ciata e à mãe de João da Bahiana, Tia Prisciliana de Santo Amaro, a Assis Valente e – parece – Silas de Oliveira.   

Artistas da Bahia: vamos à luta!

Hermínio Bello de Carvalho

DONA ZILDA PAIM, CAPITULO II

Gil não é mais Ministro, e Rodrigo Velloso – amigo querido, filho de Dona Canô e irmão mais velho (regula com minha idade, 76 anos) de Bethânia, Caetano, Roberto, Nicinha (há pouco falecida), Mabel – agora é Secretário de Cultura de Santo Amaro da Purificação. Já era, desde nascido. E sem o saber. Porque ama sua Santo Amaro, cuja história conhece a fundo, e é o maior (e único?) animador cultural da cidade. Voz respeitada no clã Veloso, ninguém se meta a besta com ele. O conheci revirando mundos e fundos para realizar projetos para o seu rincão.

Respondi ao meu querido José Eduardo que não saberia fazer com essa guerreira noventenária, a não ser enviar cópia desta carta ao Rodrigo Velloso. Também quanto ao precioso acervo de Dona Zilda Paim, mantenho na íntegra o artigo que está transcrito há alguns parágrafos. Não sei, entretanto, que recursos terá aquela Secretaria para, enfim, dar abrigo condigno a tão grande preciosidade guardada pela Profa. Zilda por tantas e tantas décadas.

Mais não posso fazer. Minha insignificância cultural e artística está, aliás, expressa numa cartinha que recebi de Salvador, de alguém que me solicitou uma entrevista por e-mail, e a dei com a maior boa vontade. Transcrevo um trecho e grifo o que me pareceu um contrasenso:

Primeiramente, muito obrigada pela entrevista, foi um prazer ler tão atenciosas e ricas palavras. Devido ao pouco espaço que temos, optamos por fazer um pequeno perfil de apresentação, já que, infelizmente, grande parte dos alunos da UFBA (Universidade Federal da Bahia) ainda não conhece sua história e seu trabalho.

O emeio que recebi, parte dele transcrito acima, revela um pouco daquilo que não vemos na grande imprensa ou mesmo nos saites e blogs que algumas universidades ainda fazem sabiamente manter como ponte de comunicação com seus alunos. Relendo o emeio, me ponho a pensar. Talvez pensem que seja mesmo um desperdício entrevistar e divulgar o que pensam animadores culturais como Zilda Paim, ou portadores de saberes que vivem à sombra. Preferem abordar personalidades que já tenham grande visibilidade na mídia, independente dos valores culturais que defendam. Passou em branco, por exemplo, em 12 de dezembro, o centenário de nascimento de Oneyda Alvarenga, discípula favorita de Mário de Andrade.

O que se depreende dessa atitude é a absoluta desnecessidade de se construir escolas, já que as crianças prescindem de outros conhecimentos que aprendem naturalmente nas ruas, nos programas “educativos” transmitidos pela maioria das redes de rádio e televisão comerciais e também através da Internet, onde conhecimentos se misturam a um enorme lixo cultural. Não nasceram analfabetos? Que continuem assim. Para que construir escolas, afinal?  Que se virem nas ruas, que aprendam nas muitas mídias alienantes que estão espalhadas nas telas de televisões ou infiltradas na Internet. Ou talvez naquela outra grande escola, “a da vida “, onde é farta a munição letal traduzida nas chamadas “cracolândias”. Para que, também,  publicar livros que não sejam apenas de entretenimento? Às favas a literatura em geral, ao lixo os poetas e pensadores.

Imagino que nem toda a Universidade pense desse jeito.

Tomara que não.

60 ANOS 

Escrevo de madrugada, ainda atordoado com as perdas, num mesmo dia, de três nomes importantes da cultura: o ator/diretor Sergio Brito, o carnavalesco Joãosinho Trinta e a cantora Cesária Évora. 

Também estou mexido, porque sou mais idoso que a cantora (70 anos), devo estar na faixa de Joãosinho Trinta (76 anos)  – e apenas 11 anos mais novo que Sergio, 88 anos.

Assesto minha lupa em 1951, ano em que batucava no teclado de uma Remington a minha coluna sobre discos na revista “Rádio-Entrevista”, que tentava competir – sem êxito, diga-se de passagem – com a badaladíssisma “Revista do Rádio”, do Ancelmo Domingos. Nossa redação ficava no mesmo prédio do estúdio do grande Halfeld, o “fotógrafo das estrelas”, título que dividia com Ávila e, um pouco abaixo, Diler e José.

Tinha 16 anos, e vivia repleto de sonhos. Perambulava pelos corredores da Rádio Nacional buscando notinhas pra coluna que escrevia. Me dava um orgulho danado de ser chamado de “jornalista”, que aliás foi como Linda Baptista me apresentou ao Getúlio Vargas quando por ela fui levado para despedir-se do presidente , já que estaria viajando naquele mesmo dia para a Europa para divulgar a boa, a ótima música brasileira que ela interpretava.

Uma das minhas colunas, naquela revista, foi republicada no livro “Áporo Itabirano, epistolografia à beira do acaso” (Imprensa Oficial de SP).

FINALIZANDO

Esteve aqui em casa a grande Fernanda Montenegro, que veio gravar a narração do especial “Áurea Martins Iluminante”, do qual também participa meu querido Chico Buarque, dividindo a bela “Maninha” com nossa Cara Preta – como Áurea se auto denomina. Informação colhida no estúdio da Biscoito Fino: a segunda voz de Chico na gravação original, dividida com Miúcha, foi escrita por Tom Jobim.

Pensei o seguinte: como agradecer a vocês, possíveis leitores do nosso blog, todo esse carinho pelo nosso trabalho? Como agradecer à equipe que construiu esse saite com tanta competência e carinho?
Pedi à nossa querida Áurea e aos parceiros Vidal Assis e Luizinho Barcelos que fossem comigo até o estúdio de meu sobrinho Saulo, pai de Giulia Battesini, sobrinha-neta querida, para gravar duas canções e dependurá-las no varal (ops!) de vocês. Metáfora, usei de metáfora, Pavan!

Portanto, feliz 2012!

LOUVA-A-DEUS (Luis Barcellos/Vidal Assis/HBC)

Um louva-a-deus pousou em minhas mãos
pedindo que lhe construísse uma casa.
E aí pensei : mas por que não ?
e à imaginação logo dei asas.
E ornei com lambrequins toda a fachada
Dos gomos de tangerina armei janelas
com samambaias fiz o telhado
com asas de borboletas teci os cortinados
E para alvorecê-la convoquei
mais de meio milhão de vagalumes
E plantei pés de abio, tamarineiros   
que espalharam essências e perfumes
E cobri seu chão de turmalinas
E inventei um céu de colibris
Foi assim, louvando a Deus por mim,
que o meu louva-a-deus ficou feliz.

(É parábola, mentira -  dirão os descrentes
incapazes de inventar um novo mundo
são coitados que jamais foram poetas
e os poetas, dizem eles, são dementes
que no abstrato infinito tão cheio de véus
pintam boisinhos pastando sobre as nuvens
onde os duendes regam as estrelas e o céu
com o pólen dos girassóis, ouro e penugens.

QUEIRA DEUS (Samba bíblico ) (Vidal Assis / Hermínio Bello de Carvalho)

I

... deixa pra lá
Já não sei se estou mesmo aqui ou acolá
Há um porém
De joelhos, prometo, eu não vou te implorar
Mas deixa estar
Essa sofreguidão ainda vai terminar
E é bom te avisar
Nesse jogo é costume se trapacear

E queira Deus
Que eu não vá me resignar
Nem me arrepender do que fui, do que fiz
Quem vai me julgar?
Se até Judas forjou
Um beijo antes de atraiçoar
Esqueça o que tanto jurou
Deixa pra lá
Se Madalena pecou
Por que é que eu não posso pecar?
Mas se arrepender como fez
Nem pensar 

II

Repare bem
Se pedires um beijo eu vou regatear
E vou te flechar
qual São |Jorge que um dia o dragão fez sangrar 
e ao ver-te abrir as comportas do corpo eu possa refugar!
Ver-te ganir e gemer e ladrar
Qual um cachorro sarnento
um afago a  implorar

E queira Deus (...)

(Mas se Jesus perdoou
Não pense que eu vá perdoar
Esqueça que um dia te amei
E deixa pra lá ...)

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Amor não explícito

A CPFL Cultura vem promovendo em Campinas (SP) a série de palestras "Paixão e Ódio na Canção", com curadoria de Zuza Homem de Mello. Em 19 de agosto passado, o evento teve a participação de Hermínio, que falou a respeito do tema "Amor não explícito" em seu cancioneiro. A palestra contou ainda com a presença do pianista Marcelo Onofri. Confira como foi:

Amor não Explícito from cpfl cultura on Vimeo.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

"Áporo Itabiraro" – Lançamento virtual



Lélia Coelho Frota, antropóloga falecida há um ano, seria a prefaciadora do “Áporo Itabirano – Epistolografia à beira do acaso”, editado pela Imprensa Oficial de São Paulo. O  livro revela as cartas que Carlos Drummond de Andrade e eu trocamos durante alguns anos. Não foi providenciada uma resenha formal para o lançamento do livro, mas de alguma forma ela foi brilhantemente rascunhada por Cecília Scharlach, no posfácio da edição.

Uma querida amiga sugeriu que eu fizesse um vídeo-release, mas confessei a ela que não tinha a menor idéia de como produzir um suporte como aquele. Recomendou-me o trabalho de Elisa Gaivota, fotógrafa excelente – e assim nasceu o trabalho que a crítica estará recebendo junto com um exemplar do livro.

Mas, e a resenha?

A solução foi improvisar uma auto-entrevista, uma forma de driblar qualquer propaganda enganosa sobre esse livro. E é o que passo a fazer em seguida.

O que mais chama atenção nesse livro?
O carinho e o respeito com que Drummond acolhia meus projetos culturais, no período em que eu atuava na função de gestor da Divisão de Música Popular do Instituto Nacional de Música, então dirigido pelo maestro Edino Krieger. Também terá pesado bastante nessa relação a amizade que me unia ao cronista João Ferreira Gomes, o Jota Efegê. Para se ter uma idéia, fomos padrinhos de casamento de Zica e Cartola. E foi Jota, afinal, quem me apresentou a grande Araci Cortes no restaurante Zicartola, isso por volta de 1962/63.

A primeira mensagem enviada a você por Drummond é de 3 de agosto de 1964. Começa aí a relação de vocês?
Não sei dizer. Nessa época eu vivia num apartamentinho tipo “Já-vi-tudo”. Você entrava, dava três passos, e já se deparava com a janela de frente pra rua. Discos, livros, minha máquina de escrever – tudo isso me exigia um comportamento quase minimalista dentro daquele espaço mínimo. Eu não dispunha de meios de arquivar tudo que eu mesmo produzia, nem sequer arquivar a correspondência, relativamente extensa, que eu mantinha com amigos que viviam no exterior, como Laurindo Almeida, Oscar Cáceres e Maria Luisa Anido, violonistas. Quantas partituras de Villa-Lobos, por exemplo, enviei pro Laurindo – que por sua vez me fazia chegar às mãos os muitos discos que gravava nos EE.UU., onde morava. Guardar como? Mas consegui preservar, por exemplo, uns cartõezinhos do Manuel Bandeira, que deveriam estar nas páginas do “Áporo”, mas a família não autorizou essa utilização. Infelizmente, por esse problema de pouquíssimo espaço, destruí muita coisa – e que me perdoe meu querido Sergio Cabral, que terá um ataque de fúria ao ler essa declaração...

O público alvo desse livro, você consegue identificá-lo?
Não muito exatamente. Durante algum tempo ministrei uma oficina, a Oficina de Coisas, na Escola Portátil de Música. Exibia programas que produzi para a extinta TVE (hoje TV Brasil), e um dos meus carros-chefe era um especial com Aracy de Almeida. Ela contava das rodas que freqüentava: na Taberna da Glória com Noel Rosa, Mário de Andrade “e outros pilantras”, como ela a eles se referia. E, no Vilariño,  seus encontros eram com Vinicius de Moraes, Rubem Braga, Antonio Maria, Di Cavalcanti. Nessas oficinas, eu falava muito de estranhezas, como a voz de Clementina, um poema de Drummond, a voz de Pastora Pavon (musa de Garcia Lorca e tema da palestra “La Teoria y Juego del Duende”, de 1922) –  e de outras belezas que nem sempre são consumidas porque não estão acessíveis a uma gama enorme de consumidores. O público alvo desse livro, concluindo a minha/sua pergunta, seria a moçada – quase 900 alunos!  – da  Escola Portátil de Música. Porque lá não se discute música, apenas. 

E a crítica literária?
Desde que estreei em livro, isso em 1962, tive acolhida boa da crítica: Sergio Milliet, Péricles Eugenio da Silva Ramos, Antonio Olinto, Stella Leonardos, Álvaro Moreyra, Pedro Bloch, Guilherme Figueiredo, Homero Senna, José Conde. Eu publicava apenas poesia.  Quando a Editora Martins  Fontes publicou a antologia “Embornal” (2005) comecei a perceber que estava cada vez mais difícil o processo de divulgação. Mas nem posso me queixar. Alguns poemas meus entraram em antologias, uma delas feita pelo jornalista Manuel da Costa Pinto (“Antologia Comentada da Poesia Brasileira do Século 21”, Publifolha) .

E o “Cartas Cariocas para Mário de Andrade”?  Também tem o caráter epistolográfico?
Não conheci Mário, que morreu em 1945, quando eu tinha dez anos. Vou me esquivar de um delírio que me acompanha até hoje, porque, muito menino, eu tinha fascínio pela Taberna – e alimento a ilusão de tê-lo visto por lá. Porque era um garoto peralta, que vivia escapulido para a rua, e morava no mesmo bairro onde ficava aquele estabelecimento. Villa-Lobos dizia que suas músicas eram como cartas espalhadas ao vento, delas não esperava resposta. Enfim: esse livro é praticamente um monólogo, o diálogo epistolográfico é meramente ficcional.

Drummond sempre atendia aos seus pedidos?
Que eu me lembre, só ignorou um: quando pedi que escrevesse sobre Clementina de Jesus. Foi uma pena, porque outros intelectuais e artistas de todas as áreas se manifestaram sobre ela – inclusive Nelson Rodrigues.

Ressaltaria algum capítulo especial no “Áporo”?
O episódio com Neuma, que dividia com Zica (do Cartola) o posto de Primeira Dama da Mangueira. Ela era fascinada pelo método Paulo Freire, e o adotava nas improvisadas aulas que dava para a garotada do morro. Escrevia um palavrão no quadro negro, a garotada estava familiarizada com aquele linguajar, e o processo de ensinamento se dava por aí. Ela adorava Drummond, lia Drummond. E um dia, quando ele foi escolhido como enredo da Escola, a imprensa se alvoroçou e um jornal quis promover o encontro de Neuma como Poeta. Conto isso no livro.

Faltou abordar algum assunto no “Áporo”?
Sim, faltou. Não contei o quanto foi importante conhecer a profa. Oneyda Alvarenga, discípula dileta do Mário de Andrade. Foi Drummond, tenho quase a certeza, quem me sugeriu que eu a procurasse, porque naquela época eu fiz um projeto em homenagem aos 90 anos que o Mário de Andrade faria. Dona Oneyda já estava doentinha, mas me recebeu efusivamente, colaborou com o projeto escrevendo um texto lindo – e me proporcionou retribuir tanta gentileza quando consegui uma verba para que sua equipe concluísse, enfim, o “Dicionário Musical Brasileiro”, tarefa que herdou de Mário. Infelizmente, quando o livro foi editado, e é aliás dedicado a mim, ela já não estava entre nós. Vale a pena lembrar que a edição desse livro se deve a uma sugestão a mim encaminhada pela Lélia Coelho Frota, então minha colega na Funarte.     

O “Áporo” é uma edição de luxo?
Sim, e nele vão encontrar um pouco da trajetória de um gestor cultural que teve o privilégio de ter seus sonhos e projetos estimulados pelo nosso maior poeta. Esse estímulo, enfim, achei oportuno que viesse a público. E a Imprensa Oficial fez um belo e competente trabalho de editoração.

Algum novo livro à vista?
Sim, o “Figuras Musicais”. São crônicas ilustradas pelo Baptistão, Bap, cartunista fantástico. Alexandre Pavan está fazendo a editoração do livro, enquanto finalizo o “Passageiro do Relâmpagos” e o romance “Antonio & Antonio’.

E o que você achou da entrevista?
Entrevistador e entrevistado tem uma coisa em comum: um ego que! 

sábado, 21 de maio de 2011

Pinga fogo


Oneyda Alvarenga

Começo falando da Prof. Oneyda Alvarenga, a grande discípula de Mário de Andrade. No calendário caprichosamente produzido pelo Museu da Imagem e do Som, constato que 2011 é um ano repleto de centenários (*) e,  entre eles, o da Profa. Oneyda.  Não fui generoso, em meu último livro  – “Áporo Itabirano” (Imprensa Oficial, 2011) – ao esquecer de narrar nosso encontro em São Paulo, em 1983, ano em que celebrávamos os 90 anos de seu/nosso Mestre Mário de Andrade. E ela, sua discipula dileta – e recomendo que se leia “Cartas, Mário de Andrade Oneyda Alvarenga (Liv. Duas cidades, 1983). Devo esse encontro à Telê Porto Ancona Lopes e, também, a Flávia Toni, ambas do IEB, Instituto de Estudos Brasileiros, que tem o privilégio de abrigar todo o acervo de Mário. Fui visitá-la em São Paulo, ela já doente (e doente terminal, sabia-se), mas me recebendo com uma generosidade que, presumo, aliás tenho a certeza, tenha sido herança de seu Mestre. 
Tarde inesquecível. Perguntei a quantas andava o “Dicionário musical brasileiro” idealizado por Mário e entregue a ela para ser finalizado. Mário faleceu em 1945, e o “Dicionário” era um monte de envelopes cheio de verbetes, nada mais do que isso. Que não se despreze, entretanto, aquele espólio cultural  construído dia a dia, fruto de uma quase obsessão. O Dicionário estava praticamente pronto, faltando apenas fazer uma editoração da pesquisa.  Não havia mais verbas para remunerar a equipe que iniciara o trabalho, me informou a Fessôra. E ela mesmo se sentia sem forças para retomar aquele legado que o Mestre lhe outorgara. Nada prometi, mas no Rio de Janeiro fui à busca de patrocínio, e o consegui. O Dicionário foi, enfim, finalizado – mas a Professorinha Oneyda não chegou a folheá-lo. Lembro que, à véspera de seu desaparecimento, Telê me telefona – e lá fui eu me despedir da Fessôra. Levei flores ao seu leito no hospital, ela já me parecia ausente. Voltei para o Rio e, no dia seguinte,  soube de sua partida. Comentei com Flávia Toni da minha tristeza em não ter sido reconhecido. Mais ou menos ela me narrou que, depois de minha visita, d. Oneyda acordou e, cercada de flores, respondeu à Flávia que lhe perguntou quem as havia trazido. “Foi o Hermínio”. Que privilégio, Deus meu, havê-la conhecido.

*****
Hipocrisia    

Despindo os véus da hipocrisia e contra todas as barreiras que encontraria no Congresso (as bancadas religiosas, sobretudo) – foi reconhecida, pelo Supremo Tribunal Federal,  a união entre pessoas do mesmo sexo. Há, imediatamente, que se dar alguns passos adiante: a penalização da homofobia e uma discussão, igualmente despida de hipocrisias, sobre a descriminalização das drogas.  Falo isso com absoluta conhecimento de causa: sou um dependente químico. Não consigo dormir sem o uso de comprimidos tarja-preta, igualmente receitados junto a outros remédios contra uma depressão compulsiva. Além do mais, gosto de beber meu vinho. Os comprimidos tarja-preta os adquiro nas farmácias mediante requisição médica. A fiscalização, louve-se, é rigorosa. Meus vinhos os adquiro e os bebo publicamente, sem que me exijam nada – além do pagamento cash ou via cartão de crédito.  Mas o meu vinho, o uisquinho de Vinicius ou a cachacinha de Lula – são drogas. Repito: drogas.

Fume à vontade, beba hectolitros de álcool, bata com seu carro, mate uma porrada de pessoas – mas não será por falta da absurdamente hipócrita advertência das indústrias que fabricam essas “drogas sociais”, advertindo nas propagandas: “o cigarro pode causar câncer”. Ou então, “beba moderadamente". "Se beber não dirija, se dirigir não beba”. Ou seja, a indústria tabagista, assim como a ruralista, a evangélica, a do tráfico, age com extrema sapiência ao não querer uma discussão aberta sobre o assunto, fugindo ao debate aberto que, já se vê pelos noticiários, está passando da hora de ser discutido. Já fui tabagista, mas porque achava elegante tragar um cigarrinho através de uma piteira longuíssima, coisas que aprendemos vendo os filmes produzidos por Hollywood e logo copiados pela nossa indústria tupiniquim.  Mas toda essa drogalhada é reconhecida pela sociedade e amplamente amparada pela publicidade que escancara o prazer de seu uso

Converso essas coisas aqui porque me assusta, e me assusta muito, o aparecimento, na área de consumo de drogas, de mais um sub produto da cocaína, mais alucinógena e dependencial do que o crack, e ainda mais barata, e por isso mesmo de mais fácil circulação entre a garotada atraída para seu consumo. Oxi seria o seu nome. Você, que circula pelas ruas, já deve ter flagrado um monte de crianças e adolescentes, e também alguns adultos, consumindo essas drogas. Esses dependentes terão, sabe-se, pouco tempo de sobrevida ao consumo que fazem dessa drogalhada que chega pelas mãos dos traficantes. E, para obtenção dessas drogas, vendem seus corpos  e almas e sonhos – se é que podemos falar em sonhos  quando vemos esses jovens suicidas serem levados ao sacrifício sob o silêncio de parte da sociedade e dos poderes que a representam. 

Seria leviano afirmar que tal silêncio abriga uma certa indiferença ou mesmo permissivividade por parte dos órgãos que deveriam cuidar do assunto. Porque só despertamos para a realidade quando somos encostados no muro,  ameaçados por um canivete afiado, uma faca enferrujada ou até mesmo um revolver de brinquedo.

Não há porque discordar do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso: há que se trazer essa discussão não só para os fóruns adequados, mas com a participação ativa de toda a sociedade. Mas que esse debate não se dê em meio às  ondas de voluptuosa hipocrisia que costumam cercar essas discussões. Duvido, e duvido muito, que alguém fique indiferente ao noticiário dos jornais, sobretudo os televisivos, falando sobre as cracolândias. Não tenho filhos nem netos consangüíneos, mas não preciso te-los para sabe-los – parafraseando um verso de Vinicius de Moraes.

Sou contra a pena de morte, mas sou a favor de se classificar, de se tipificar  como crime hediondo, passível das penas mais severas, a quem induz uma criança ao uso dessas e outras drogas. Elas, essas drogas mais recentes e baratas e de mais rápido efeito, mais do que  degradar, fazem-nas  prostituir-se, induzem essas crianças à morte, a um tipo de suicídio que nem ela mesmo tem consciência de que o está praticando.

Sem hipocrisia, Presidenta. Temos ministérios demais, e políticas de menos. Senhores parlamentares, juristas, jornalistas, compositores, gente de todas as cores (como no belo samba de Lupicinio) – há que se unir para uma discussão sobre essa praga que dizima a vida de milhares de crianças e adolescentes.

*****
A Ministra

Existe alguma dúvida de que a ministra Ana de Hollanda está sendo fritada, colocada como carne de segunda num espeto de churrascaria chinfrim, assada como uma posta de acém colocada na brasa? Há quem duvide disso? É o chamado “fogo amigo”, partido de agentes culturais insatisfeitos ou mesmo de parte da classe artística que ainda não conseguiu a voz sussurrante da Ministra. Mas que ela aprenda também a contrapor-se a esse fogo amigo com ações reais: a abertura de mercado de trabalho, por exemplo. E a todos nos se recomenda uma certa paciência com a discussão sobre o uso da Internet, e com todas as mídias que estão sendo colocadas no mercado – e que fazem uso da música, dos textos, de tudo aquilo que produzimos. É um fenômeno muito recente, e que jamais alcançará contornos definitivos. A tecnologia avança de uma forma assustadora.    

(*) Peterpan, autor de “Se queres saber”, sucesso original de sua cunhada Emilinha Borba, e depois regravado esplendidamente por Nana Caymmi; o pintor argentino Carybé, que adotou a Bahia como berço, e que ilustrou obras de Garcia Márquez, Mario de Andrade, Pierre Verger e, sobretudo, de seu grande amigo Jorge Amado. (Tenho belas lembranças de uma verdadeira maratona que fizemos por Salvador, ele mais Jorge, Caymmi e eu – acho que já contei essa história num de meus livros); Assis Valente, outro bahiano porreta, consagrado por Carmem Miranda, e nascido em Santo Amaro da Purificação; Nelson Werneck Sodré, e há que não esquecê-lo por ter-nos legado a “História da Literatura Brasileira”; Mário Rossi, autor do “Beija-me”, gravado inicialmente por Ciro Monteiro, e co-autor do belíssimo “Cidade do interior”, de parceria com Marino Pinto, consagrado por Elizeth Cardoso; Paulo Gracindo, nosso genial Odorico Paraguaçu, personagem criado por Dias Gomes – sem esquecermos que fazia dupla com Brandão Filho no “Balança mas não cai”; Anacleto Rosas Júnior – dou um doce para quem souber quem foi. Autor de “Três boiadeiros”, “Casinha branca", “Rancho vazio” (não confundir com "No rancho fundo"); Antonio Almeida, autor de sucessos memoráveis. Fiquemos com as figuras femininas que exaltou: “Juraci”, “Doralice”, “Helena, Helena”. E quem não sabe cantarolar o “A sudade mata a gente”? Teve inúmeros parceiros, entre eles Braguinha, Mario Lago, Alberto Ribeiro; centenário também de Nelson Cavaquinho, cujo primeiro registro de voz-e-violão, ah! não me tirem esse privilégio de tê-lo feito no LP “Elizeth sobe o morro” (1965). Orgulho-me, ainda, de ter sido seu parceiro; Mário Lago, também fazendo 100 anos, uma das fiuras antológicas da cultura brasileira. Esplêndido letrista, fantástico memorialista. E, enfim, a Prof. Oneyda Alvarenga. Quase todos os conheci pessoalmente. O tempo, enfim, não pára – já dizia Cazuza.   


quarta-feira, 27 de abril de 2011

Os 7 Mandamentos

01. Não pense pequeno, que isso é próprio dos medíocres e dos covardes.

02. Trabalhe em equipe: a capacidade de germinação se amplia.

03. Convoque os mais honestos e competentes, deixando de lado os invejosos e os carreiristas de poder (lembre-se que ele é sempre provisório). Desconfie dos bajuladores e dos muito falantes, que nem sempre são os mais operosos. São surfistas do poder, que sobrevivem de futricas e agem sempre à sombra. Abra espaço para gente nova. Oxigenar as idéias é sempre estimulante.

04. Não tenha medo da concorrência. Se você encontrar alguém mais competente do que você, aprenda com ele. Você vai crescer mais. Também não tenha medo de copiar uma boa idéia. Mas não se esqueça de dar o crédito a quem a gerou. Lembre-se: ninguém é absolutamente genial para criar todos os dias uma coisa nova. Não se esqueça também de que seus delírios são pagos pelo contribuinte. Mas sonhe sempre, cultive utopias.

05. Não respeite quem sonega informação, engavetando-a ou guardando-a só para si. Desconfie daquele que não ensina jamais o chamado “pulo do gato”. Quem assim procede está praticando um crime de lesa-cultura. Acredite: o meretrício e o genocídio cultural existem sim e em doses industriais e deliberadamente alienantes. Se você desconfiar de algum mal-feito, bote a boca no trombone para não ser conivente. Ninguém é tão poderoso assim que não consiga se desestabilizar diante de uma denúncia bem fundamentada.

06. Vá pelo caminho alternativo. Faça com que seu projeto tenha efeito multiplicador, e que seus eventos gerem resíduos (é assim que se faz memória: através do registro do fato). Procure parcerias. Não acredite naqueles que pregam que o povo não gosta de coisa boa e que toda juventude é alienada. Desconfie muito de quem despreza os mais velhos. Aprenda com os índios que veneram seus pajés e com eles se aconselham. Mário de Andrade era um pajé.

07. Acredite: cultura é matéria de segurança nacional, nossa música é um bem ecológico. Pense grande. Pense bonito. Pense brasileiro.

HERMÍNIO BELLO DE CARVALHO




***
Descobri o texto acima nos guardados do poeta e compositor Hermínio Bello de Carvalho. O documento não possui data, tampouco o autor soube me precisar quando o escreveu. Mas podemos dizer, quase com completa certeza, que é do período (1977-1989) em que Hermínio foi diretor da Divisão de Música Popular Brasileira da Funarte, onde, entre tantas ações memoráveis, criou o Projeto Pixinguinha. O texto original se dirigia aos seus colaboradores naquela instituição. Acredito que todos os mandamentos permanecem atualíssimos e devem ser compartilhados por quem trabalha direta ou indiretamente com a cultura.

ALEXANDRE PAVAN