segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Janelas, portas e cartas abertas

HELICÓPTEROS E BEIJA-FLORES

Vejo a abordagem cinematográfica feita pela polícia ao triplex do patrono da Escola de Samba Beija-Flor. Um helicóptero sobrevoa o prédio de luxo, os policiais descem de rapel – e a câmera abre para a piscina onde um lindo beija-flor está pintado sob as águas azulíssismas. Vamos jogar nossos olhos para o obituário de Joãozinho Trinta, n’ “O Globo” de 18/dez/2011: “O carnavalesco que exaltou o luxo passou os últimos dias na pobreza (....), não tinha plano de saúde e ninguém sabia quem ia pagar a conta do Hospital”. Na pobreza? Foi assim que morreu o genial carnavalesco que elevou a Beija-Flor aos píncaros da glória? Façam uma leitura atenta do que expus e chorem suas lágrimas de sangue sobre as águas azuis da tal piscina onde, no fundo dela, adormece pintado um lindo beija-flor. Voltarei ao assunto, noutro tópico. 

CAMERATA BRASILIS

Não, não fui ao recital-lançamento do CD da Camerata Brasilis. Disco belíssimo. Convidado de honra: Nailor Proveta. Que músico fantástico esse Proveta! E participação especial de Aquiles Moraes e Everson Moraes. É desses dois últimos jovens músicos que vos falo agora. Eu os conheci como integrantes do conjunto “Os Matutos”, grupo nascido em Cordeiro e regado com a água de cheiro do conhecimento pelos professores da Escola Portátil de Música.

Há alguns dias o Everson (hoje com 25 anos) me telefonou pra saber se eu tinha alguma coisa do Norato, trombonista fabuloso que há décadas se aposentou como integrante da Orquestra Sinfônica Brasileira. Por “alguma coisa” se entenda foto, partitura, um escrito qualquer. 

Se conto a suncês essas coisas é porque elas tem relação com este saite e com o blog que precisaria ocupá-lo mais vezes com as coisas novidadeiras que se passam no mundo da música, esse mundinho onde existem provetas, noratos, eversons e aquiles. Bem, já vos conto. O susto do trombonista Everson foi grande quando minha tela de TV foi ocupado por aquele músico ebanáceo, num registro que fiz na TVE em 1977. Que grande músico, meu Deus! E que conversa boa, a dele! O deslumbramento se instalou nos olhinhos-faróis de meu querido Everson.

“Informação não se engaveta”, “Informação tem que circular” – esses bordões os fiz ecoarem pelas trompas de Eustáquio  do nosso jovem trombonista.  E lá se foi nosso Everson com uma cópia do vídeo debaixo do braço. E aí a história ganha desdobramentos. Fuça daqui e dali, e eis que o matutinho descobre que, ao contrário do que pensávamos, Norato está vivíssimo. Aos 91 anos, esquecido por essa geração que nunca o ouviu tocar, ei-lo agora fazendo uma espécie de master class na UFRJ, levado pelas mãos jovens e novidadeiras desse menino que nos dá orgulho danado em vê-lo praticando o fazer cultural, levando adiante aquilo que aprendeu. Seu irmão mais novo, Aquiles, é um trompetista que o João de Aquino diz ter “lábios de mel”, tal a beleza de seu sopro. Vamos encontrá-lo, agora, tocando na Sinfônica como um de seus mais jovens integrantes.

Nosso acervo tem essa divina serventia: mostrar os noratos que existem por aí, sob um manto de total invisibilidade, manto que os eversons da vida tratam de descobrir o que era apenas um busto sem placa identificatória na praça da desmemoriada memória musical brasileira.

Obediente ao ditador que ora escreve este relato, Everson gravou a master class. Ficou de me mandar uma cópia. Vou cobrar.

BODAS DE DIAMANTE

Há dias fui às Bodas de Diamante, 60 anos de união de minha única irmã, Gilda, com meu cunhadão Dino Battesini. Sangue italiano, o dele, diferente do nosso: bem caipira, bem Ilha da Jibóia, onde nasceu minha mãe, filha de um violeiro afamado de nome Gregório. Quando havia um desafio nas imediações, minha avó materna tomava uns góros, pegava a viola, fazia um farnel – e lá ia meu avô na canoinha remada por ela, enquanto ele ia “temperando” a viola para o desafio. Que só voltasse vencedor, o que invariavelmente acontecia. Meu pai terá nascido em Rio Bonito, alguns dizem. Outros, pelas bandas de Cabo Frio. Tinha ascendência nobre de judeus portugueses que fugiam das perseguições da época. Nunca perguntei ao velho, quando ele ainda sabia responder as coisas, quem seria o tal Barão de Monte Bello. A prof. Neusa Fernandes ficou de pesquisar isso em Portugual, mas até agora nada! Dino e Gilda me deram sobrinhos, sobrinhos netos. Alguns vieram com o dom da música, outros com apetite de vida e saberes. Puta orgulho tenho dessa garotada. Minha irmã está linda aos 86 anos: mãe, avó, bisavó. Ela e o marido ainda se beijam na boca. Meu sobrinho toca um violão maneiro, vai de Villa-Lobos a Leo Brouwer. Sua filha, Giulia, é cantora e compositora. Que sobrinha-neta talentosa, essa menina. Freqüentou a Oficina de Coisas da – claro! – Escola Portátil de Música, tendo o tio-avô como Oficineiro.

SALVADOR, ALAGADOS, BAHIA

Como o assunto ainda é o nosso saite, transcrevo (para depois comentar) a carta que, com autorização do remetente, divulgo neste espaço:

Querido Hermínio, bom dia. Como você está? Recebeu o jornal dos estudantes de comunicação que te enviei? Olha, escrevo para te agradecer a sua atenção e dizer que agora com essa matéria centenas de pessoas daqui da Bahia, dessa nova geração que é muito desinformada, começam a te conhecer e me empenho nisso porque tenho por você o mesmo respeito que tenho pela Clementina, Drummond, Cartola, Aracy, Mário de Andrade e tantas pessoas importantes para o Brasil e o mundo que aprendi a amar com você. Você é a chave que me fez descobrir dona Zilda, dona Coleta, Emilia Biancardi, Antonio Candido e tanta gente que hoje faz parte de minha vida de uma maneira real. Do mesmo modo você agora é real e presente para os jovens estudantes que são órfãos de conhecimento e de cultura. Peço desculpas pelas mal traçadas linhas da estudante que te escreveu, e, no entanto, estou certo de que a sua disponibilidade em conceder a entrevista que virou o “perfil” está abrindo as portas do entendimento de muita gente jovem da Bahia que vai visitar o teu acervo e trilhar novos caminhos na cultura. Estou à sua disposição. Não fique triste e, meu querido, me responda, pois estou preocupado, pois você é muito importante para mim e não quero e nem quis te trazer nenhum dissabor, somente quero que você e a sua obra sejam conhecidos neste estado onde a cultura está indo ladeira abaixo e isso me dói muito. A Aninha Franco te escreveu e quando vier à Bahia, irás no Teatro XVIII e na República, a casa que Aninha criou no Pelourinho para cuidar da cultura e lá está você e sua obra, o que me fez chorar muito por saber que você é tão bem cuidado por uma Bahia que eu nem sonhava existir. É isso. Meu velho, estou aqui, muitos precisam de você, te peço de me responder para acalentar meu coração que não quer ver meu velho triste, mas sempre reconhecido e amado, porque se hoje eu estou estudando e lutando pela cultura brasileira é porque conheci o senhor, meu querido mestre. Um abraço do Zé Eduardo.

Apresentemos o missivista a você, eventual ledor deste blog: mestre em psicologia e doutor em saúde pública pela Universidade Federal da Bahia, ele trabalha com projetos sociais na área de Novos Alagados – onde, aliás, nasceu. Autor dos livros “Travessias: a adolescência em Novos Alagados”; “Novos alagados, histórias do povo e do lugar” e do livro que estou lendo agora – “Cuidado como vão, repercussões do homicídio entre jovens da periferia”. Nome completo? José Eduardo Ferreira Santos, mulato que nem o autor destas linhas, e que agora está sendo lido na Itália – porque um livro dele, mais recente, acabou de ser editado por lá. Eu o conheci através dos Irmãos Caverna, Jussiê e Daniel, que foram meus “alunos”(aspeio, porque jamais fui um professor) na Oficina (de Coisas) que ministrei na Escola Portátil de Música.

Enfim, essa cartinha que vaidosamente transcrevi é para dividir com os construtores do nosso saite a repercussão que ele tem junto à gente da Bahia.

DONA ZILDA PAIM, SANTO AMARO DA PURIFICAÇÃO

Acho melhor não dar muitos volteios, e ficar ainda com nosso amigo Zé Eduardo que, aflito, me escreve:

Querido Hermínio, boa tarde. Estive em Santo Amaro e vi que a situação da querida Zilda Paim se complica: sua casa foi assaltada e seu acervo corre risco. Ela tem 92 anos. Entrei em contato com a artista Aninha Franco e vamos ao secretário de cultura. Neste sentido, gostaria de te pedir para atualizar e me enviar assinada a carta que você escreveu sobre ela em 2007. Te agradeço, pois estou me empenhando em cuidar da cultura e de dona Zilda que te manda um beijo – e depois te envio pequeno novo livro dela. Com gratidão, José Eduardo

Vou transcrever um artigo que escrevi há algum tempo (“Um protesto carioca”, sobre essa grande figura que é a Prof. Zilda Paim, há poucos dias citada pelo Caetano (Veloso) em sua coluna dominical n’O Globo:

Me perguntam quem é essa tal de Zilda Paim, a quem dedico o livro sobre Aracy de Almeida que estou lançando agora pela Editora Folha Seca.

Ela é uma estudiosa do folclore, uma professora de quase 90 anos de idade e que deu régua-e-compasso a muito pesquisador que ama as manifestações do recôncavo baiano.

Ela, a Prof. Hildegardes Vianna (já falecida) e a também Prof. Emilia Biancardi, foram peças fundamentais na minha vida. A primeira, todo mundo sabe que, além de pesquisadora emérita, tem um texto fantástico que, volta e meia, me faz pensar no Caymmi – que adora redescobrir o vocabulário bahiano, cujas atipicidades ela domina como uma espécie de Jorge Amado de saias. Emilia, todos sabem, é do “Viva a Bahia”, foi comigo à Europa e  depois seu grupo de bailarinos, cantores a percussionistas (com o saudoso “seu” Negão à frente)  nos acompanhou aos Estados Unidos, numa inesquecível – em  todos os sentidos – excursão que tinha, ainda, uma estreante bahiana, então  jogadora de basquete, hoje a famosa Simone.

Profa. Zilda Paim entrou nessa história numa ida a Santo Amaro, a convite de Bethânia. Ela desejava me apresentar ao Roberto Mendes, compositor santamarense. Queria, acho, nos fazer parceiros. Conseguiu.

Sim, eu já tinha ouvido falar de Dona Zilda, e pedi ao Roberto que me levasse até lá. Fiquei fascinado com o vasto material sobre Santo Amaro que ela coletava e guardava em arquivos toscos. Perguntei: e o que a Senhora vai fazer com tudo isso? “Tacar fogo!”, respondeu a desaforada, só pra me atazanar o espírito. Riu e me explicou que ninguém na cidade dava nenhum valor àquilo.

Selecionei uns artigos, encomendei lá em Santo Amaro mesmo que o digitassem – e recebo esse catatau no Rio e começo a mexer meus pauzinhos. Nessas horas consulto sempre o Roberto Sant’Anna, que eu conheço há décadas. Ele entendeu meu interesse e, para minha surpresa, logo depois recebo pelos Correios um volume com alguns exemplares do livro “Relicário popular” da insigne mestra, livro que ele, belo animador cultural, cavou uma edição na  Secretaria da Cultura e Turismo – isso em 1999.

Quando Dona Canô fez 95 anos, fui lá convocado por Rodrigo e Jota Veloso para me apresentar no belo teatro que erigiram na cidade. Coisa de primeiro mundo. E revi Dona Zilda Paim, agora toda feliz com um memorial que destinaram para ela, enfim, ter todo seu acervo preservado. Era, ainda, uma promessa.

Alegria de pobre dura pouco. Recebo a notícia que, por desarranjos burocráticos que nem consigo atinar quais sejam, tudo voltou à estaca zero. Infelizmente Caymmi não está no Rio, Bethânia está gravando seu DVD e Caetano – cidadão do mundo – anda pelos Estados Unidos, lançando seu disco. Nem tenho com quem reclamar.

Mas aí lembrei que o Gil é agora Ministro, e não sei como ele pode apitar aí nas bandas de Santo Amaro. De qualquer forma, acho que a Profa. Zilda Paim merece homenagens, e não aporrinhações desse tipo a essa altura da vida.

E, afinal, ela é uma espécie de guardiã da cultura de Santo Amaro da Purificação.

E é preciso salvar a terra que deu berço à Tia Ciata e à mãe de João da Bahiana, Tia Prisciliana de Santo Amaro, a Assis Valente e – parece – Silas de Oliveira.   

Artistas da Bahia: vamos à luta!

Hermínio Bello de Carvalho

DONA ZILDA PAIM, CAPITULO II

Gil não é mais Ministro, e Rodrigo Velloso – amigo querido, filho de Dona Canô e irmão mais velho (regula com minha idade, 76 anos) de Bethânia, Caetano, Roberto, Nicinha (há pouco falecida), Mabel – agora é Secretário de Cultura de Santo Amaro da Purificação. Já era, desde nascido. E sem o saber. Porque ama sua Santo Amaro, cuja história conhece a fundo, e é o maior (e único?) animador cultural da cidade. Voz respeitada no clã Veloso, ninguém se meta a besta com ele. O conheci revirando mundos e fundos para realizar projetos para o seu rincão.

Respondi ao meu querido José Eduardo que não saberia fazer com essa guerreira noventenária, a não ser enviar cópia desta carta ao Rodrigo Velloso. Também quanto ao precioso acervo de Dona Zilda Paim, mantenho na íntegra o artigo que está transcrito há alguns parágrafos. Não sei, entretanto, que recursos terá aquela Secretaria para, enfim, dar abrigo condigno a tão grande preciosidade guardada pela Profa. Zilda por tantas e tantas décadas.

Mais não posso fazer. Minha insignificância cultural e artística está, aliás, expressa numa cartinha que recebi de Salvador, de alguém que me solicitou uma entrevista por e-mail, e a dei com a maior boa vontade. Transcrevo um trecho e grifo o que me pareceu um contrasenso:

Primeiramente, muito obrigada pela entrevista, foi um prazer ler tão atenciosas e ricas palavras. Devido ao pouco espaço que temos, optamos por fazer um pequeno perfil de apresentação, já que, infelizmente, grande parte dos alunos da UFBA (Universidade Federal da Bahia) ainda não conhece sua história e seu trabalho.

O emeio que recebi, parte dele transcrito acima, revela um pouco daquilo que não vemos na grande imprensa ou mesmo nos saites e blogs que algumas universidades ainda fazem sabiamente manter como ponte de comunicação com seus alunos. Relendo o emeio, me ponho a pensar. Talvez pensem que seja mesmo um desperdício entrevistar e divulgar o que pensam animadores culturais como Zilda Paim, ou portadores de saberes que vivem à sombra. Preferem abordar personalidades que já tenham grande visibilidade na mídia, independente dos valores culturais que defendam. Passou em branco, por exemplo, em 12 de dezembro, o centenário de nascimento de Oneyda Alvarenga, discípula favorita de Mário de Andrade.

O que se depreende dessa atitude é a absoluta desnecessidade de se construir escolas, já que as crianças prescindem de outros conhecimentos que aprendem naturalmente nas ruas, nos programas “educativos” transmitidos pela maioria das redes de rádio e televisão comerciais e também através da Internet, onde conhecimentos se misturam a um enorme lixo cultural. Não nasceram analfabetos? Que continuem assim. Para que construir escolas, afinal?  Que se virem nas ruas, que aprendam nas muitas mídias alienantes que estão espalhadas nas telas de televisões ou infiltradas na Internet. Ou talvez naquela outra grande escola, “a da vida “, onde é farta a munição letal traduzida nas chamadas “cracolândias”. Para que, também,  publicar livros que não sejam apenas de entretenimento? Às favas a literatura em geral, ao lixo os poetas e pensadores.

Imagino que nem toda a Universidade pense desse jeito.

Tomara que não.

60 ANOS 

Escrevo de madrugada, ainda atordoado com as perdas, num mesmo dia, de três nomes importantes da cultura: o ator/diretor Sergio Brito, o carnavalesco Joãosinho Trinta e a cantora Cesária Évora. 

Também estou mexido, porque sou mais idoso que a cantora (70 anos), devo estar na faixa de Joãosinho Trinta (76 anos)  – e apenas 11 anos mais novo que Sergio, 88 anos.

Assesto minha lupa em 1951, ano em que batucava no teclado de uma Remington a minha coluna sobre discos na revista “Rádio-Entrevista”, que tentava competir – sem êxito, diga-se de passagem – com a badaladíssisma “Revista do Rádio”, do Ancelmo Domingos. Nossa redação ficava no mesmo prédio do estúdio do grande Halfeld, o “fotógrafo das estrelas”, título que dividia com Ávila e, um pouco abaixo, Diler e José.

Tinha 16 anos, e vivia repleto de sonhos. Perambulava pelos corredores da Rádio Nacional buscando notinhas pra coluna que escrevia. Me dava um orgulho danado de ser chamado de “jornalista”, que aliás foi como Linda Baptista me apresentou ao Getúlio Vargas quando por ela fui levado para despedir-se do presidente , já que estaria viajando naquele mesmo dia para a Europa para divulgar a boa, a ótima música brasileira que ela interpretava.

Uma das minhas colunas, naquela revista, foi republicada no livro “Áporo Itabirano, epistolografia à beira do acaso” (Imprensa Oficial de SP).

FINALIZANDO

Esteve aqui em casa a grande Fernanda Montenegro, que veio gravar a narração do especial “Áurea Martins Iluminante”, do qual também participa meu querido Chico Buarque, dividindo a bela “Maninha” com nossa Cara Preta – como Áurea se auto denomina. Informação colhida no estúdio da Biscoito Fino: a segunda voz de Chico na gravação original, dividida com Miúcha, foi escrita por Tom Jobim.

Pensei o seguinte: como agradecer a vocês, possíveis leitores do nosso blog, todo esse carinho pelo nosso trabalho? Como agradecer à equipe que construiu esse saite com tanta competência e carinho?
Pedi à nossa querida Áurea e aos parceiros Vidal Assis e Luizinho Barcelos que fossem comigo até o estúdio de meu sobrinho Saulo, pai de Giulia Battesini, sobrinha-neta querida, para gravar duas canções e dependurá-las no varal (ops!) de vocês. Metáfora, usei de metáfora, Pavan!

Portanto, feliz 2012!

LOUVA-A-DEUS (Luis Barcellos/Vidal Assis/HBC)

Um louva-a-deus pousou em minhas mãos
pedindo que lhe construísse uma casa.
E aí pensei : mas por que não ?
e à imaginação logo dei asas.
E ornei com lambrequins toda a fachada
Dos gomos de tangerina armei janelas
com samambaias fiz o telhado
com asas de borboletas teci os cortinados
E para alvorecê-la convoquei
mais de meio milhão de vagalumes
E plantei pés de abio, tamarineiros   
que espalharam essências e perfumes
E cobri seu chão de turmalinas
E inventei um céu de colibris
Foi assim, louvando a Deus por mim,
que o meu louva-a-deus ficou feliz.

(É parábola, mentira -  dirão os descrentes
incapazes de inventar um novo mundo
são coitados que jamais foram poetas
e os poetas, dizem eles, são dementes
que no abstrato infinito tão cheio de véus
pintam boisinhos pastando sobre as nuvens
onde os duendes regam as estrelas e o céu
com o pólen dos girassóis, ouro e penugens.

QUEIRA DEUS (Samba bíblico ) (Vidal Assis / Hermínio Bello de Carvalho)

I

... deixa pra lá
Já não sei se estou mesmo aqui ou acolá
Há um porém
De joelhos, prometo, eu não vou te implorar
Mas deixa estar
Essa sofreguidão ainda vai terminar
E é bom te avisar
Nesse jogo é costume se trapacear

E queira Deus
Que eu não vá me resignar
Nem me arrepender do que fui, do que fiz
Quem vai me julgar?
Se até Judas forjou
Um beijo antes de atraiçoar
Esqueça o que tanto jurou
Deixa pra lá
Se Madalena pecou
Por que é que eu não posso pecar?
Mas se arrepender como fez
Nem pensar 

II

Repare bem
Se pedires um beijo eu vou regatear
E vou te flechar
qual São |Jorge que um dia o dragão fez sangrar 
e ao ver-te abrir as comportas do corpo eu possa refugar!
Ver-te ganir e gemer e ladrar
Qual um cachorro sarnento
um afago a  implorar

E queira Deus (...)

(Mas se Jesus perdoou
Não pense que eu vá perdoar
Esqueça que um dia te amei
E deixa pra lá ...)