quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Uma reflexão

Minha saudosa amiga Eneida de Moraes procurava responder a todas as cartas recebidas e comparecer a todos os eventos a que era convidada. Seu corpo repousa hoje em Belém do Grão Pará, num túmulo que ela desejava localizado sob uma mangueira bem frondosa, e com a lápide ostentando o epitáfio que ditou em vida: “Essa mulher nunca topou chantagem”.

Hoje o tempo é curto, e lançamentos e exposições se multiplicaram ao infinito, impedindo que se vá abraçar o amigo escritor ou aquele outro que tomou posse na Academia de Letras (releve a ausência, meu querido Luiz Carlos Horta), o artista plástico que inaugura uma nova fase (alô, João Magalhães!) ou comparecer a uma estréia imperdível. Minha Eneida enlouqueceria com essa nova demanda, estimulada pela Internet.

Os construtores do saite Acervo HBC informam já fora contabilizados 15.000 acessos, e me parece que o número não é desprezível. “Precisamos de um novo texto de abertura”, recebo a ordem, sob a chibata do editor.

Desejo apenas explicar, como se preciso fosse, que sou repetitivo. Mas não aplico a técnica nazista de Goebbels, a de que a reiteração de uma mentira acaba por tornando-a verdade-verdadeira. Mas, volta-e-meia, me vejo xerocando antigas idéias (prefiro chamá-las de bordões) ao digitar meus textos – e você mesmo já estará se acautelando (“Xi, lá vem ele com o ‘é preciso abrasileirar o brasileiro’). Comecemos por esse aí, que se infiltra na maioria dos textos que redijo. Antes de tudo, vamos logo esclarecer que esse quase aforismo eu o pincei de uma das primeiras cartas endereçadas por Mário de Andrade a Carlos Drummond (também) de Andrade. O “A mentira é a verdade provisória”, outro dos meus bordões, foi descaradamente copiado de Salomão e, por amor à verdade, tenho que dividir os créditos com Dame Aracy de Almeida, Arquiduquesa do Encantado, que me forneceu o mote original: “o lábio da verdade ficará pra sempre, mas a língua mentirosa dura um só momento”.

Portanto, os néscios poderão pespegar mais um rótulo aos inúmeros que carrego na vida: o de plagiador, ou a de produtor de bordões claramente absorvidos de autores alheios. A Salomão e Mário de Andrade, minhas desculpas.

Enfim, preciso produzir um novo texto, porque o anterior já caducou. Mas, e finalizando a questão nele abordada, esclareço que, ao contrário do que noticiou O Globo, não procurei o Sergio Mamberti. Mas acho legítima a postulação, que escorre e transborda pelas veias da Internet, para ocupação do cargo de Diretor da Divisão de Música Popular da Funarte. Mas que não se engalfinhem os postulantes, recomendo. Exibam um currículo musculoso nos termos competência e probidade, e boa sorte. (Estou rezando pra que a ocupação do tal cargo não seja uma “cota do PT”, como me informou um dos postulantes. Apenas uma dúvida: o cargo tão disputado... está vago?) Fim.

Dito isto, passo adiante um e-mail recebido de meu querido Zé Luiz do Manguezal, que há dezenas de anos luta pela preservação do Jequiá, que ele cuida espalhando milhares de mudas de mangue-sapateiro, lá na Colônia Z-10 de Pescadores, na Ilha do Governador do Rio de Janeiro. Sabemos que os manguezais são oxigenadores das águas, e que os predadores estão aí transformando em lixeiras a céu aberto aquelas pequenas trincheiras mantidas por sonhadores iguais a Zé Luiz.

E esclareço que, a partir do próximo parágrafo, faço uma reflexão que se originou do e-mail enviado pelo meu amigo: “Meu poeta, amigo e pai, desculpe te incomodar. Gostaria de saber a possibilidade de trazer para o jequiá uma escola portátil de música ou coisa similar. Nossas crianças estão precisando de algo cultural. Nós não conseguimos mais um patrocínio para o Siri na Lata. Então pensei se o amigo teria como ajudar com idéias novas. Abraços do Zé Luiz”.

(Continua)